Ontem bateu um bode, sabe?
Tava lembrando do meu pai, um dos motivos pra esse blog.
Tava lembrando da conclusão a que cheguei no dia em que resolvi fazer o blog.
Ele descobriu que tinha diabétes quando eu tiha uns 11 anos, mais ou menos, morreu quando eu tinha 20. Hoje tenho 22.
Lá pros meus 15, 16 anos, a gente começou a brigar muito... Eu usava as grosserias que ele fazia com a minha mãe como justificativa, mas a verdade é que eu tava com muita raiva dele.
Raiva porque meu super herói tava me deixando. Tava ficando cada dia mais magro e mais fraco e não fazia nada pra reverter isso, sabendo que era possível.
Não seguia a dieta, continuava bebendo, negligenciava a medicação.
Eu não consigo, sabe, não consigo mesmo.
Lembro de quando eu era pequena e minha avó teve um derrame. Ficou de cama, usando fralda, dependendo de todo mundo pra tudo.
Eu disse à minha mãe: Não fique doente desse jeito, pois eu não vou cuidar!
Não é preguiça, nem nada disso, é só que eu não consigo ver alguém que era fonte da minha força, alguém que sempre deu um jeito em tudo...naquele estado quase vegetativo.
Era isso, eu tava com muito ódio. Porque ele tava indo embora, e esse foi o único jeito de eu pedir pra ele f icar...só que só nos afastou.
Meus pais tiveram 3 filhos. Eu spu a única que está viva. Um menino que era pra ter uns 26, morreu 2 dias depois do parto, e uma menina, de 23, meningite, aos 3.
Meu pai a vida inteira me falou uma coisa: A gente nasce preparado pra enterrar pai e mãe, mas ninguém no mundo tá preparado pra enterrar um filho, é um buraco que nunca fecha.
É o que me alivia.
Ele não me enterrou.
Ele era o meu melhor amigo, o meu mundo, na verdade, eu não via nada na minha frente que não fosse ele, de repente tudo mudou, mas acho que por mais tristes, algumas partes dessa história aconteceram do jeito certo.
Como estávamos "brigados", ele já vinha me fazendo falta há algum tempo, então eu já estava habituada à saudade. Porque se estivéssemos agarrados como éramos, eu teria morrido junto, com toda a certeza, sem medo de estar exagerando.
E na minha família a gente sempre foi bem resolvido com esse lance de morte, fui criada assim, sabendo que uma hora vai acontecer, a gente querendo, ou não.
Então, a minha ficha demora a cair, fui começar a assimilar que não ia mais ouvir o assobio no portão, ou sentir o cheiro do verniz, com cigarros e cerveja. Que nunca mais ele ia cantar pra mim, nunca, nunca mais a voz dele. De vez enquando é demais pra mim e eu quebro. Nunca mais um: Boa noite, Coruja. Furinho no queixo, a barba que às vezes parecia lixa de marcenaria.
Um abraço que só cabia a gente. E ninguém podia me machucar.
Falhei tanto, fui tão egoísta, tão infantil, quando já não era mais nenhuma criança.
Peço perdão todos os dias, o dia inteiro. Foram 2 semanas no hospital, só consegui ir 2 vezes. Na 1 abracei e beijei como fiz durante anos. Eu já tinha me esquecido de como isso fazia bem, mas na 2ª, na 2ª eu num queria ir, não queria ver você de novo, numa cama, com fralda, inchado por que os rins já num funcionavam bem, pesando menos de 40kg. Não o super-homem. Não o meu pai.
Isso foi num Sábado. Domingo ficou todo mundo achando que alguém ia e ninguém foi.Na Segunda. Bom, na Segunda...
Me perdoa.
Pelo menos uma coisa eu fiz certo, você não me enterrou, tá vendo?
Por favor, me pedoa.
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